A economia é importante — mas o PIB não a reflete

É frequente ouvirmos falar em crescimento económico. Implicitamente, é o Produto Interno Bruto (PIB) que serve de base para a discussão — um indicador que consiste na diferença entre o valor de todas as transações e o valor das importações.

O PIB — um indicador pensado por William Petty no século XVII — exclui tudo o que existe fora dos mercados. Por construção, ignora o espaço onde acontece a vida familiar e afetiva. Estas lacunas são expectáveis: ninguém espera que o PIB contabilize as amizades ou os abraços, nem que seja um indicador de felicidade. O problema vem de assumir, erradamente, que o aumento do PIB leva a uma melhoria das condições económicas.

Em 2024, há um país que está “a crescer” acima dos 30%. Trata-se do Guiana, que começou recentememte a vender o petróleo que tinha debaixo do seu solo. Extrair petróleo não é produzir petróleo, mas o PIB não é sensível a essa distinção. Para além disso, o PIB não é influenciado por efeitos secundários que não só prejudicam o bem-estar, como comprometem a produção futura — por exemplo, as alterações climáticas. Ora, qualquer noção razoável de crescimento deve referir-se a um crescimento sustentado, o que não é de todo o caso da delapidação do património natural.

Não é apenas a destruição da natureza que pode contribuir positivamente para o PIB: durante a primeira guerra mundial, a produção das economias inglesa, francesa e estaduniense aumentou muito significativamente. Tanto vender bombas como participar em ofensivas militares faz subir o PIB — uma prática que continua nos dias de hoje.

Em sentido inverso, quando avanços tecnológicos permitem processos mais eficientes, o PIB tende a baixar. Imaginemos voltar à situação pré-internet em que a comunicação volta a ser feita via telégrafo ou através de cartas. Esse cenário implica um enorme volume de transações para conseguir comunicar à distância — algo que é hoje virtualmente gratuito e incomparavelmente mais rápido e cómodo. O caso é análogo em relação à eficiência dos mercados: monopólios tendem a aumentar o PIB.

Vejamos um último exemplo paradigmático: o da saúde. Um bom sistema de saúde é aquele que permite à população viver confortavelmente tantos anos quanto possível. Num cenário em que a população é ativa e evita comportamentos de risco associados a várias patologias — por exemplo, uma população que evita o tabaco e o álcool — o setor da saúde contribui menos para o PIB do que no cenário oposto, em que a população é pouco saudável e requer cuidados de saúde continuados.

Comparemos os resultados dos sistemas de saúde dos Estados Unidos da América com o nosso: apesar de a esperança média de vida em Portugal ser significativamente superior, os americanos gastam três vezes mais por habitante. Este dinheiro, mal gasto, faz aumentar consideravelmente o PIB dos EUA, sem que daí venham vantagens — muito pelo contrário.

A saúde é um mau negócio — quanto mais saudáveis, menos receita —, contrariamente à doença. Degradar a saúde da população levaria a um (falso!) crescimento económico.

Assim, e paradoxalmente, os artigos cujos títulos contêm a palavra “economia” tendem a não falar, de facto, da economia. Quando temos subjacente a uma discussão um indicador pré-industrial tão insuficiente como o PIB, esta torna-se irrelevante.

Sejamos mais exigentes com a forma como avaliamos a região e o país — o volume de transações é uma métrica demasiado grosseira. Ultrapassemos o PIB — analisemos a saúde, a educação, a habitação e os vários mercados à luz dos indicadores mais adequados em cada caso.