O genocídio e os coniventes

A ONU estima terem morrido, entre outubro a março, em Gaza, mais crianças do que o total das que morreram em todos os conflitos do mundo juntos, entre 2019 e 2022 — o que inclui meses da invasão da Ucrânia.

Desde outubro, foram identificadas cerca de 8 mil crianças que morreram vítimas de bombardeamentos por parte de israel. É aproximadamente o número de crianças que existe no concelho de Ponta Delgada.

Oito mil crianças mortas. Vítimas de bombardeamentos. Por parte de israel.

O que se passa em Gaza não é uma guerra.

A este número é preciso somar as que continuam por identificar, as desaparecidas e os cadáveres enterrados sob os escombros. Fora isso, há que contar com todas as que morreram de problemas de saúde tratáveis, mas requerem acesso a cuidados de saúde que deixam de estar disponíveis quando se decide rebentar os hospitais.

A tragédia não se fica pelas crianças que já morreram: bem mais de um milhão de pessoas foram forçadas a fugir de casa e encontram-se deslocadas — isto dentro de uma área menor que a da ilha Terceira. O governo israelita usa a fome como arma, e um terço dos bebés com menos de 2 anos está severamente malnutrido. Antes do fim de março, já tinham sido largadas 25 mil toneladas de bombas em Gaza.

Vinte e cinco milhões de kilos de bombas. Num território em que estão deslocadas mais de um milhão de pessoas. Numa área menor do que a da ilha Terceira.

O que se passa em Gaza não é uma guerra.

Uma investigação do Guardian relata como polícias e soldados israelitas conspiram com a extrema-direita para impedir a entrada de ajuda humanitária. Para além disso, uma análise da CNN revela como o ataque das forças armadas israelitas à World Central Kitchen — um ataque que matou uma heroína e seis heróis ajudantes humanitários — foi levado a cabo através de múltiplos golpes de precisão.

O que se passa em Gaza não é uma guerra.

Por Lisboa, carlos moedas achou por bem ceder o Cinema São Jorge para a comemoração do 76º aniversário do estado israelita. De pouco valeu o abaixo-assinado dos trabalhadores do cinema. De pouco valeu o apelo da vereadora municipal do Bloco de Esquerda, Beatriz Gomes Dias, à retirada do apoio da autarquia às celebrações.

Infelizmente, não se ouviu nenhuma condenação por parte do PSD ou do CDS-PP, partidos que apoiaram a candidatura do presidente da câmara de Lisboa. Tivesse Jorge Moreira da Silva, atual subsecretário-geral das Nações Unidas e diretor executivo da UNOPS, ganho a liderança do PSD, talvez houvesse hoje mais decência no partido.

Portugal continua a não reconhecer o estado da Palestina. Os nossos aliados da NATO — os estadunidenses, claro, mas também os alemães — continuam a fornecer as armas para o genocídio. As sanções ao estado israelita continuam sem existir; como continuam sem existir sanções a quem comanda o massacre e a quem lucra com ele.