[draft] Anti-sistema, ou anti-decência?

1. CHEGA

Os Açores fazem-se representar na Assembleia da República por cinco deputados — todos homens.

Um deles é Miguel Arruda, do CHEGA. Será um nome desconhecido da maioria dos açorianos e é praticamente omisso no que toca à imprensa, mas é importante prestar atenção ao que publica no (ex-)Twitter.

Em publicações de 29 de dezembro e, novamente, a 2 de janeiro, Arruda considera ser “um preso político” alguém que foi recentemente condenado a 2 anos e 10 meses de pena de prisão efetiva, por propor a “prostituição forçada das gajas do Bloco”. Acresce que o condenado tem uma “longa e persistente carreira criminal” — que remonta a 10 de julho de 1995, noite em que um grupo de neonazis assassinou Alcindo Monteiro.

Este criminoso pediu a Musk que intercedesse junto da administração Trump para que lhe fosse concedido asilo político na embaixada estadunidense em Lisboa. Não tardou até que Arruda viesse ao auxílio, escrevendo I am a member of the Portuguese parliament and I can say with certainty that [he] is a political prisoner. @elonmusk.

Num momento ímpar do patriotismo que tanto apregoa, o deputado considerou que fazia sentido a ingerência de um país terceiro no cumprimento de uma sentença de um Tribunal português. De caminho, mostrou o respeito que tem pela separação de poderes: Arruda julga-se no direito de, enquanto deputado, decidir que sentenças da Justiça são razoáveis.

Como pode a imprensa regional ter deixado passar em claro esta conduta de um deputado eleito?

Há que lembrar o que é que o CHEGA verdadeiramente representa. Miguel Arruda considera que a liberdade de expressão deve incluir incitamento à violência por quem já tem um passado violento. Francisco Lima, vice-presidente do CHEGA Açores, defende na assembleia regional o uso do glifosato enquanto detém a TERCEIRA PHARMA, vendedora de herbicidas. André Ventura almoça com alguns dos empresários mais poderosos do país — de Francisco Cruz Martins, a João Maria Bravo, a Paulo Mirpuri (Chairman Hi Fly) — e faz por segurar apoios financeiros dos donos disto tudo: da família Mello (proprietária da CUF), à família Champalimaud — sendo que estas contribuições poderão ser apenas da ponta do iceberg, visto que em muitos casos se “revelou impossível saber quem são os doadores”.

O CHEGA não é anti-sistema: o sistema dá colo ao CHEGA e vice-versa. É, isso sim, anti-decência.

2. Reconhecimento (iminente?) da Palestina

O Projeto de Resolução 463/XVI/1, que recomenda ao Governo que reconheça, de forma imediata, o Estado da Palestina será discutido e votado, respetivamente, nos dias 30 e 31 deste mês.

O Ocidente não pode continuar a defender a solução dos dois Estados e continuar a reconhecer apenas aquele que genocida o povo do outro. Com efeito, as últimas décadas na Palestina têm sido marcadas por condições de vida absolutamente horrendas, tendo o último ano sido indescritível. Ainda na semana passada, nas horas seguintes ao anúncio de acordo para um cessar-fogo, foram mortos mais de 100 Palestinianos na sequência de ataques sionistas — incluindo pelo menos 21 crianças. Não é altura de tirar os olhos de Gaza.

Apesar do Ocidente manter a linha sionista, a Palestina é reconhecida por 146 dos 193 países da ONU. Portugal deve acompanhar a posição recentemente assumida pela Espanha, Noruega, Irlanda e Eslovénia.

Sendo este Projeto de Resolução apresentado pelo PS, será aprovado caso o PSD o queira. Assim, convido quem me lê a contactar os deputados do PSD Açores Francisco Pimentel e Paulo Moniz relativamente a esta matéria. Tal possível através do Correio do Cidadão, disponível em www.parlamento.pt — já o fiz. Reconhecer o Estado da Palestina é uma questão de direitos humanos.