Em 2018, estava numa aula de criptografia, quando o professor nos disse, muito laconicamente, “usem o Signal”. Não fazia a mais pequena ideia do que ele estava a falar: o termo era-me desconhecido — tanto que o anotei mal —, e nem me havia sido explicado que estávamos a falar de uma aplicação de mensagens instantâneas. Tivesse sido outro professor, o mais provável teria sido deixar a frase passar, mas já tinha aprendido a prestar atenção ao que este dizia.

Não tardou até estar a ler sobre o Signal em https://signal.org. Descobri então que funcionava tal e qual como o WhatsApp, mas sem os efeitos secundários: um exemplo concreto de como a tecnologia não está necessariamente associada à invasão da nossa privacidade nem à monetização dos nossos dados. Revolucionário.

O ponto central da questão é o facto de, contrariamente ao WhatsApp e à generalidade das apps, o Signal ser uma aplicação cujo código é público. Ou seja, é possível a qualquer pessoa descarregar o código e inspecioná-lo linha a linha. Esta transparência permite-nos confirmar que a aplicação apenas acede à câmara ou ao microfone quando necessário — durante videochamadas, por exemplo — e garante que todas as comunicações são devidamente encriptadas.

Mais importante ainda, podemos verificar que os nossos dados e metadados (informações sobre quando, com quem e durante quanto tempo comunicamos) servem exclusivamente para facilitar a comunicação, não sendo recolhidos para fins comerciais.

O código do WhatsApp, por outro lado, é secreto. Para além de não podermos verificar o que realmente faz, há a questão fundamental do seu modelo de negócios. A Meta (a proprietária) disponibiliza este produto sem apresentar uma fatura aos utilizadores. Porquê? Porque fazem dinheiro de outra forma.

Embora o conteúdo das conversas seja alegadamente encriptado, os metadados — informações sobre os nossos padrões de comunicação, contactos e comportamentos — são sistematicamente recolhidos e monetizados. Aplica-se aqui a máxima das empresas tecnológicas: se não estás a pagar pelo produto, és o produto.

A credibilidade desta análise ganha força quando consideramos a história de Brian Acton, cofundador do WhatsApp. Em 2017, dois anos após a venda à Meta, Acton decidiu abandonar o projeto, abdicando de 850 milhões de dólares. A razão? Estava profundamente insatisfeito com o rumo que Mark Zuckerberg queria dar ao produto e com as práticas de monetização implementadas.

Após deixar o WhatsApp, Acton canalizou os seus esforços para criar a Signal Technology Foundation, uma organização sem fins lucrativos, trabalhando com Moxie Marlinspike, o criador do protocolo criptográfico do Signal. Esta decisão representa mais do que uma mudança de carreira — é uma declaração de princípios e um alerta.

Estou a par do principal argumento usado contra a troca: “toda a gente tem WhatsApp e é assim que consigo comunicar. No Signal, ia falar com quem?”. De facto, a adoção do Signal está longe de ser universal. Apesar de ser, há já vários anos, amplamente usado por entusiastas da privacidade, jornalistas e altos representantes governamentais conscientes da importância da segurança das comunicações, muita gente não tem a app instalada.

Contudo, esta limitação é facilmente superável com algum empenho em convencer as pessoas próximas. Pessoalmente, uso o Signal em exclusivo há vários anos, tendo gradualmente convertido a minha rede de contactos. O resultado? Hoje, os meus três avós com smartphone comunicam através do Signal.

Trocar o WhatsApp pelo Signal é um ato de libertação digital. Como diria Hugo Almeida, é fácil, eficaz e liberal. No verdadeiro sentido do termo, para variar.