Um ano de genocídio, após décadas de ocupação
Foi há cerca de um ano que o Hamas massacrou várias centenas de civis israelitas. A 7 de outubro, sucederam-se os ataques horrorosos e várias pessoas foram capturadas e tornadas reféns.
Por essa altura, enquanto condenava veementemente os massacres, António Guterres lembrou que estes “não aconteceram num vácuo”. Há já muitos anos que a vida na Palestina é extraordinariamente difícil, particularmente em Gaza.
Em apenas 6 meses, de março a outubro de 1948, mais de 500 aldeias foram arrasadas e 800 mil palestinianos foram forçados a abandonar as suas terras. Esta tragédia, comummente chamada de nakba, está minuciosamente documentada no livro “A limpeza étnica da Palestina”, escrito pelo historiador israelita Ilan Pappe.
Desde 1967 que o povo palestiniano vive sob ocupação militar israelita, num regime de apartheid. Esta ocupação está aliada ao expansionismo sionista ultra-agressivo, que, ano após ano, lhe rouba mais terra. Sobre este assunto, não posso deixar de recomendar a excelente entrevista que o Fumaça fez, em 2021, ao ex-militar israelita Ori Givati. Givati relata as rotineiras invasões noturnas do exército às casas de famílias que sabiam ser inocentes e como o objetivo declarado era o de fazer os palestinianos sentir que “não podiam levantar a cabeça”.
Tínhamos então, em 2023, uma situação explosiva: na faixa de Gaza, que tem uma área inferior à da ilha Terceira, viviam mais de dois milhões de pessoas, em condições insalubres e cercadas por um muro.
Imaginemos o que seria forçar toda a população das restantes ilhas açorianas a mudar-se para a ilha Terceira. Agora, imaginemos repetir este processo não duas, não três, mas mais de dez vezes! No caso de Gaza, trata-se de amontoar milhões de pessoas pobres num pequeno pedaço de terra extremamente árido.
É neste contexto que, a 9 de outubro de 2023, Yoav Gallant, ministro da defesa israelita afirmou o seguinte: “Ordenei um cerco total à Faixa de Gaza. Não haverá eletricidade, nem alimentos, nem combustível, está tudo fechado. Estamos a lutar contra animais humanos e estamos a agir em conformidade”. É um exemplo cristalino de punição coletiva de um povo, em resposta a um terrível ataque no qual participou uma ínfima percentagem da população.
Desde então, a situação em Gaza tem sido absolutamente trágica e apenas a palavra genocídio lhe faz justiça. Já morreram mais de 40 mil palestinianos, sendo a percentagem de crianças altíssima e sem paralelo no que diz respeito a conflitos armados. Os bombardeamentos não param e são os nossos aliados da NATO quem fornece o armamento.
Por cá, o governo continua a defender a solução dos dois Estados, apesar de apenas reconhecer um deles: aquele que está decidido a rebentar irreversivelmente com o outro. No parlamento regional, o voto que saudava o reconhecimento oficial do Estado da Palestina por quatro países europeus foi rejeitado por PSD, CDS, IL e CH.
No entanto, é possível, através da pressão da sociedade civil, levar o Estado português a ser solidário com o povo palestiniano.
Exemplo disso, foi o recente episódio do navio Kathrin, que está carregado com contentores de explosivos destinados a Israel. Foi a força dos ativistas, à qual se aliaram o BE e o PCP, que levou o governo a fazer pedidos de esclarecimento à empresa proprietária do navio. O resultado foi a remoção da bandeira portuguesa deste navio. Até arranjar outra bandeira, o Kathrin não poderá descarregar a sua carga genocida.
Urge manter o genocídio na ordem do dia. Urge impedi-lo. Urge defender direitos humanos — que só se defendem intransigentemente!