Sábado passado tive a sorte de assistir ao filme Honeyjoon. O filme foi gravado em São Miguel e teve como inspiração episódios biográficos de Lilian Mehrel, a artista de ascendência curdo-iraniana que o escreveu e dirigiu.

É um filme no qual abundam as nossas paisagens, que retrata — através de uma procissão, com filarmónica, na Maia — a nossa cultura, e que tem vários momentos divertidos. Para além disso, aborda a revolução iraniana de 1979 (levada a cabo por fanáticos religiosos e com terríveis consequências para a liberdade das iranianas) e a onda de protestos no Irão, na sequência da morte de Mahsa Amini, em 2022, às mãos da “polícia da moralidade”.

O filme foca-se numa relação entre mãe e filha, durante o período de luto por que passam, após a morte do marido/pai. Dado o encanto do defunto com os Açores, as duas viajam até São Miguel para comemorar o primeiro aniversário da sua morte. Vale muito a pena vê-lo e espero que chegue aos cinemas açorianos em breve!

A existência deste filme evidencia algo que tende a escapar-nos: apesar dos mais de 6 mil quilómetros que separam São Miguel do Irão, existem pessoas com ligações profundas a ambos os sítios. A partir da sua história pessoal, e inspirada pela nossa natureza e pelas nossas gentes, Mehrel criou um filme fantástico que une o Irão aos Açores.

Mais perto do que o Irão está Gaza. Compreendo o desejo de separar o mundo em que vivemos do mundo em que ocorre o genocídio. Desconfio que a passividade com que se assiste aos horrores que por lá se sucedem se deve, não tanto à distância, mas principalmente a uma vontade de remeter a Palestina para um plano abstrato.

Em Gaza, vivem pessoas reais, como a pediatra Alaa al-Najjar, sobre quem escrevi previamente. Lá, são assassinadas, quotidianamente, mães como Reem Zeidan. A história de Reem Zeidan — morta com um tiro na testa enquanto se dirigia, com a sua filha de 20 anos e filho de 12, a um ponto de distribuição de comida — é tão difícil de ler que, esta semana, não fui capaz de a escrever.

Sabemos que, por lá, a matança é sistemática e a fome generalizada. Sabemos que jornalistas e ajudantes humanitários tanto são impedidos de entrar como são mortos. Sabemos que são fanáticos religiosos, como Daniella Weiss e Itamar Ben-Gvir, os instigadores dos massacres. E sabemos que, ainda assim, os nossos aliados da NATO fornecem armas às forças de ocupação e extermínio israelitas.

Do mesmo modo que temos acesso a fotos e vídeos da catástrofe em Gaza, os palestinianos sabem das posições que tomamos no Ocidente. É desolador ver, enquanto alguém filma um bombardeamento ou um tiroteio, outra vítima reagir: “Estás a filmar para quem? Não querem saber de nós!”. E quando, para variar, o Ocidente tenta ajudar Gaza — como foi o caso do navio humanitário Madleen — o povo palestiniano acompanha: “Estamos a observar-vos desde Gaza. Não desligamos o ecrã”.

Mesmo estando longe, as nossas ações são consequentes. Assim, pergunto diretamente a Paulo Moniz e a Paulo Nascimento Cabral, que escrevem para este jornal: qual a justificação para o PSD não querer reconhecer, imediatamente, o Estado da Palestina? Pergunto a Pedro Nascimento Cabral se, desde a sua audiência com o embaixador sionista em julho passado, já teve a decência de mudar de posição relativamente à “cooperação entre Israel e Ponta Delgada”. Aos candidatos às Câmaras Municipais, deixo a sugestão de tentar fazer de alguma cidade em Gaza cidade-irmã do respetivo município, mostrando-lhes solidariedade.